A moral invertida: crise dos valores societários e o silêncio dos bons.


O Brasil e a comunidade universitária, em particular, assistiram ao suicídio de um homem em silêncio, com raras exceções. Homem esse que se viu proibido, por força da Lei, de circular em sua própria casa, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Lugar onde alicerçou sua formação acadêmica, consciência política, científica, técnica e pedagógica, desde o movimento estudantil até a cadeira mais alta da instituição que ajudou a se Re(criar), Reitor.
Naqueles bancos, ensinou e aprendeu o exercício diário à “consciência crítica da sociedade”. Dito de outra forma, ajudou a ampliar os processos de indagações, questionamentos, investigação, debates, discernimento, a fim de propor caminhos para solucionar problemas reais da sociedade às conquistas do saber humano em uma universidade pública, democrática e comprometida, exclusivamente, com  a busca, cada vez mais séria, da verdade, da ética das virtudes e do amor.
Morte visível aos olhos de uma sociedade que dorme, enquanto a democracia se esfacela em praça pública. Em seus últimos minutos de sua vida, escolheu o lugar do consumo máximo para denunciar as lacunas deixadas por uma sociedade que atravessa o outro de soslaio, como se nada acontecesse com ninguém em lugar algum. Afinal, o que é um local onde as atenções se voltam apenas para o consumo? Ninguém o impediria uma vez que aquele que vê não vê o que vê. Quanto aos meios de comunicação? Trataram o fato em nota de roda pé. Mas o minuto destinado para denegrir sua imagem e reputação em praça pública, este sim, foi bem utilizado como manchete principal.
Mais uma morte para entrar no obituário do país. Um país em que os mandados de prisão viraram “santa inquisição”, hábito natural, quase um vaivém na rotina do trabalho dos juizados. Cegos pelo desejo compulsivo de punir, sem o direito aos contraditórios, sem nenhuma preocupação em despir a honestidade, a honra e a moral de gestores públicos construídos nas mais diferentes dimensões de suas vidas, em uma sociedade democrática de direitos, onde não deveria existir quem está acima ou abaixo das regras, e mais, onde os déspotas esclarecidos desejam ser confundidos com os democratas, mas, se confundem entre becas, togas e jalecos.
Penso que, diante desse fato, e outros, onde, de igual maneira a vida é banalizada, qualquer um diz o que quer no público com ares de pseudoverdades, como se verdades fossem. O mais grave, é que o silêncio impera entre túmulos ermos de valores morais, provocando colapsos e mortes lentas e invisíveis. Isto faz como que as universidades públicas, que deveriam ser reconhecidas como territórios de extrema relevância social, política, econômica, cultural, como que lhe requer para apoiar o desenvolvimento do Estado e da sociedade, passem a ser humilhadas, destituídas de liturgias de cargos, avassalando crises éticas e criando uma epidemia de medos.
Será que estamos de olhos vendados, ou as pupilas circulam no ponto onde se escreve a ideia de que todos somos ‘bandidos’, ninguém mais é honesto, passam a régua por baixo. A cegueira é nossa? Ou estão nos fazendo acreditar, propositadamente, que os gestores das universidades públicas necessitam ficar reféns em seus modos de administrar, para atender apenas aos ditames legais. Não que estes ditames sejam desnecessários, ao contrário, mas não podem ser desmedidos, afinal, foram elaborados para proteger os seres humanos em sociedade e não para ameaçá-los, adoecê-los e matá-los.
Deixarmo-nos cair nessa vala comum da atual conjuntura brasileira, significa estarmos condenados a gerenciar sob a batuta da burocracia “legalista”, onde seu excesso vem criando pânico, levando os excelentes professores(as) pesquisadores a aversão e medo de gerenciarem os bens públicos. O alarme de que poderemos dormir livres e acordarmos cerceados do direito de ir e vir, empobrece a ousadia e a oportunidade de olharmos para o futuro das Universidades públicas em uma sociedade de economia globalizada. 
Afinal, o que impera neste modelo de moral invertida, é uma visível crise dos valores societários. Muitos seguem preocupados em manterem acesas suas fogueiras de vaidades, negando-se a testemunhar a dignidade dos seres humanos do bem. Oxalá que possamos desenvolver outras e novas lentes que decodifiquem o espectro dos igualmente novos paradigmas da sociedade contemporânea à luz do que nos alertava Martin Luther King, ao nos dizer: “O que me preocupa, não é o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética, o que me preocupa é o silêncio dos bons.” Acrescento: essa mudez atrapalha o crescimento da democracia que se faz diuturnamente. Se não, os ditadores de espírito sentam-se à mesa do poder.

Fonte: http://sorisomail.com/partilha/442544.html

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