Agrotóxico faz mal à saúde: Suprema Corte, rogai por nós.
Quem de nós não assistiu ainda o documentário “O
veneno está na mesa”, produzido pelo cineasta Silvio Tendler[1]?
A voz de fundo nos informa que “desde 2008, o Brasil é o maior consumidor de Agrotóxico”,
e cada brasileiro consome, em média, 5,2 litros de agrotóxicos por ano. Essa
informação, adicionada àquela imagem do avião sobrevoando um prato com
alimentos, aparentemente “saudáveis”, causa arrepios. Parece filme de terror. Mas,
qual é a novidade? O Brasil sofre profundamente desse mal, desde o início dos
anos 60, a pretexto do crescimento e desenvolvimento da economia, enquanto a
saúde da natureza e das pessoas ficam relegadas a plano algum.
Mais grave ainda é o desprezo pela saúde dos
trabalhadores e suas famílias, sobretudo, do campo, expostos aos impactos
ambientais e suas consequências, a exemplo da infertilidade do solo, das perdas
da biodiversidade, do equilíbrio ecológico, das fontes hídricas, queda da
população de abelhas, que evidenciam a ganância do modelo agronegocista e a irresponsabilidade dos fabricantes dos agrotóxicos
em limitar as informações nos rótulos dos seus produtos.
Como se não bastasse o
desconhecimento do perigo por parte dos próprios trabalhadores que manejam a
cadeia produtiva, que vai desde os que pulverizam, manipulam, transportam,
vendem, entre outros, e mais desumano ainda, à exposição das famílias, que, por
necessidade de sobrevivência (emprego e moradia), estão expostas nas áreas de
plantação “todo santo dia”, à mercê da própria sorte. Estas questões sim, evidenciam
a omissão do Estado e seus governos no dever de proteger os direitos humano e
da natureza de viverem saudáveis.
Omissão porque, contraditoriamente, ao tempo que
aprova, em 1999, a Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN), que reza
promover, prover e proteger os direitos humanos à saúde e à alimentação, faz
concessões fiscais à produção e comercialização de agrotóxicos no País, por
meio do Convênio nº 100/1997, do Conselho Nacional de Política Fazendária
(Confaz), e do Decreto Federal 7.660/2011.
E para suspender as isenções fiscais dos
tributos que recaem sobre substâncias tóxicas, ocasionando o intenso aumento do
consumo, o que viola os direitos fundamentais à saúde das pessoas e do ambiente
equilibrado, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) ajuizou perante o Supremo
Tribunal Federal a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. º 5553.
O convênio reduz 60% da base de cálculo do
Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de agrotóxicos nas
saídas interestaduais. Já o decreto, obriga os Estados e o Distrito Federal a
concederem a mesma redução nas operações internas envolvendo esses produtos. Ou
seja, isenção total de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) aos
agrotóxicos.
Fonte: http://www.guiadenutricao.com.br/alimentos-com-maior-nivel-¸-contaminacao-por-agrotoxicos/
O PSOL nos faz lembrar que o uso intensivo de
agrotóxicos coloca o Brasil na posição de campeão mundial de consumo destes
produtos desde 2008, e quatro commodities agrícolas concentram este
consumo: soja, cana-de-açúcar, milho e algodão. Reproduz informações do Anuário
do Agronegócio, segundo as quais as indústrias produtoras dos chamados
“defensivos agrícolas” tiveram receita líquida de cerca de R$ 15 bilhões em
2010, e 92% desse total são controlados por empresas de capital estrangeiro.
Afirma que a isenção fiscal de agrotóxicos viola
frontalmente normas constitucionais, sendo incompatível com os direitos
essenciais ao meio ambiente equilibrado e à saúde, além de violar o princípio
da seletividade tributária, na medida em que realizam uma “essencialidade às
avessas, ou seja, contrária ao interesse público”.
Com rigor ético, político, social, e
humanitário, acrescenta ainda os seguintes argumentos:
“O uso intensivo de
agrotóxicos – e a concessão de benefícios fiscais para sua indústria – violam
profundamente os comandos do sistema normativo de tutela ambiental. Dentre os
impactos ambientais, percebe-se que esses produtos químicos eliminam insetos
necessários ao equilíbrio das plantas, contaminam a terra, o ar e os recursos
hídricos. Assim, poluem e causam danos incalculáveis ao meio ambiente. Na sua
aplicação, acabam se dispersando no ar e são carregados pelas chuvas para os
rios, contaminando o solo e o lençol freático. O aumento da utilização dos
agrotóxicos – e da contaminação por eles causada – relaciona-se diretamente com
a expansão do agronegócio no país, cujo modelo, além dos agroquímicos, leva a
outros grandes impactos socioambientais, como o desmatamento, o monocultivo em
grandes extensões, a alteração da microfauna do solo e outros”.
As instituições comprometidas com a Campanha
Nacional Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, vem ampliando seus
fóruns de debates, sustentados nos seguintes valores: a Segurança Alimentar e Nutricional
(SAN) e Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA), são bens inalienáveis do
povo brasileiro. Logo, faz-se urgente nos posicionarmos acerca desse quadro
mortal que contamina o mapa do pais: 64%
dos alimentos estão contaminados por agrotóxicos (Agência Nacional de
Vigilância Sanitária-ANVISA, 2013);
34.147 notificações de intoxicação por agrotóxico foram registradas de 2007 a
2014 (MS/DataSUS); 288% foram os percentuais de aumento do uso de agrotóxicos
entre 2000 e 2012 (Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola-Sindag); U$12bi foi o faturamento da indústria de
agrotóxicos no Brasil em 2014 (Associação Nacional de Defesa Vegetal-Andef).
E mais,
intensificamos os sinais de alertas às exigências do cumprimento, por parte do
Estado, governos e empresários da cadeia produtiva de agrotóxicos, o
cumprimento das medidas preventivas que nos apontam o Dossiê da Associação
Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco)[2],
organizado pelo professor e pesquisador Fernando Carneiro, coordenador do Observatório do
Campo, Floresta e Águas, do Núcleo de Estudos em Saúde Pública, da Universidade
de Brasília, NESP/CEAM/UnB, o qual tive a honra de coordenar. À época, vi de
perto a dedicação deste destemido companheiro em buscar evidências
científicas sobre a Saúde de Populações Expostas aos Agrotóxicos. Esse
pesquisador, de renome nacional e internacional, foi ameaçado de crime por usar
a expressão veneno para falar dos problemas dos “defensivos agrícolas”. Termo
usado pela Federação da Agricultura do Estado do Ceará (FAEC), entidade que
ousa querer calar a voz de milhares de Fernandos, Marias, Carlos, Lias, e de
organismos internacionais das Nações Unidas (ONU), só para citar alguns (OMS; FAO;
IFAD; UNICEF; WFP), e os nacionais, a exemplo do INCA, FIOCRUZ, o NESP/CEAM/UnB
e a ABRASCO.
O que o PSOL e entidades que defendem a saúde e
vida das pessoas e dos ambientes estamos a dizer? As terras e as pessoas são
mais importantes que números ou taxas de crescimento econômico a custas de
perdas das vidas. E que não banalizaremos os problemas causados pelos
agrotóxicos como se fossem inevitáveis, sem alertar para os governos, ditos
progressistas e populares, que suas contradições expressam uma traição, na
ausência do seu dever de assegurar acesso aos alimentos (seguros e adequados), ambientes e
vidas saudáveis para todos(as), como direitos da natureza e dos seres humanos. Assim, Suprema Corte, rogai por
nós.
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